Confira a entrevista no player abaixo.
Aqui você confere a transcrição da entrevista:
Meu nome é Viktor D. Salis, nasci em Atenas.
Por uma série de circunstâncias estou aqui no Brasil, agora … vinte anos a última vez. Fiz meus dois doutorados, um na Suíça e outro na França, e me dedico ao estudo das tradições míticas gregas, orientais, egípcias e meu objetivo é resgatar esse saber para algo que tanta falta nos faz na modernidade que é a arte de viver, a arte de aprender a amar. Enfim, é muito interessante que no século da comunicação tanta solidão esteja dançando por aí. Então, a minha formação é de psicólogo. Fiz formação em psicanálise também. Não que eu tenha abandonado, mas eu me dirijo hoje a uma outra perspectiva que eu chamo de terapia mítica que é essa busca das essências, dos mitos, dos símbolos em cada um para que ele possa encontrar um sentido na sua existência e possa, não vou dizer que vai responder, mas que possa abraçar profundamente a questão “de onde viestes?” “o que fazes aqui”, “para onde vais?”, e esse é o significado do enigma da esfinge como tal. Essa tem sido a minha busca, em cima desses preceitos que trabalho, que publiquei minhas cinquenta obras e pretendo continuar para poder ser útil. O que eu devo dizer a vocês é o seguinte, a melhor coisa do mundo, e eu tenho setenta e um para setenta e dois anos, que é … não tem coisa melhor do que você chegar nessa idade sendo útil, sendo necessário para as pessoas que estão à sua volta, meus amados alunos, pessoas que tanto precisam de mim. Acordar, sendo útil e necessário, não tem preço, para o resto tem Credicard, mas para isso não tem preço.
Qual a importância de se estudar os mitos para compreender a alma humana?
Olha, o mito só tem sentido se ele for recriado por você. Não é para ser papagaiado, ele só tem sentido se ele desperta em você uma chama. Essa é a essência do processo terapêutico mítico e da busca de cada um. Você tem que ir atrás daquilo que te ilumina, daquilo que te chama, por isso que a gente ama tanto os mitos, e tantos mistérios que nos apresentam. A gente não entende o porquê, mas eles nos fascinam, tem mitos que mexem com a gente. Por que mexem com um e não mexem com o outro? Como disse Roberto Calasso em uma obra prima que é a que ele escreveu até recentemente “As núpcias de Cadmo e Harmonia”, parafraseando, inclusive, Teóclito no sexto século antes de Cristo. “Essas coisas nunca aconteceram, mas sempre existiram e elas sempre iluminaram nossas almas.” Então, o mito nada mais é do que uma energia cósmica que te adentra. Não é uma invenção, é uma energia cósmica como os planetas, como a energia, como a gravitação. É uma energia simbólica que te adentra e te desperta e te atrai. Não tenha dúvidas, vá atrás, faz parte do mistério da tua existência e está no teu caminho cósmico.
Qual a relação dos mitos e a imaginação?
Como é possível a imaginação sem mitos, né? O imaginário é um mundo mágico do deus Morfeu, o deus na forma. Morfus em grego quer dizer sabedoria, cultura. Amorfo quer dizer disforme. Aliás, está no Vernáculo a palavra amorfo. Todas essas palavras são gregas. Morfeu, ao contrário do que se imagina e se vulgarizou, não é o deus do sono. “Ah, vou cair nos braços de Morfeu.”, quer dizer que eu vou dormir, bobagem. Morfeu é o deus dos sonhos, é o deus do imaginário, é aquilo que torna o mundo fantástico, divino em formas possíveis aqui na nossa Terra, no nosso planeta. Portanto ele é o motor da criação, e o motor da criação é o imaginário, sem ele é impossível.
Quais os mitos a sociedade brasileira tem vivido ultimamente?
Em primeiro lugar, acho que mitos estão quase desaparecendo. Existe a visão vulgar do mito, que é “o cara é o mito” que quer dizer “o cara é incrível”, isso é uma bobagem, isso é uma deformação do significado. Ou “isto é mito”, “isto é fake”, “isto é mentira”. Isso está vulgarizado, nada a ver com o significado original da palavra mito que quer dizer linguagem dos deuses. Então vamos nos ater ao significado original, aquilo que desperta. Neste sentido, a realidade brasileira tem sido desmistificada. Ou seja, cada vez menos a cultura brasileira, o verdadeiro Folclore Nacional, está sendo destruído por um consumismo alucinado, por uma americanização idiota, excluindo aquilo que é mais belo no Brasil. Pouco resta na Bahia, que é a riqueza do folclore baiano, a riqueza da cultura, o interior da terra onde existe algo que é genuinamente brasileiro. Onde que nós encontramos isso genuinamente ainda? Na belíssima música brasileira, verdadeira, não esse lixo que está por aí. Em um Tom Jobim, em um Villa Lobos, no Francisco Minhoni, esses gênios nossos da música, do cavaquinho por exemplo. Enfim, na literatura desde um Jorge Amado, Guimarães Rosa, isso sim é literatura de verdade, é cultura brasileira. E, além disso, às vezes uma Tarsila, um Lasar Segall. Nós temos uma riqueza cultural maravilhosa que infelizmente, cada vez mais está sendo abandonada por esta americanização e, não só isso, por esse consumismo desvairado, por essa forma banal onde toda criação maravilhosa brasileira, legítima e genuína, estão sendo deixadas de lado.
Como é possível descobrir a pré-figuração mítica que cada um carrega em sua alma?
Olha, o famoso conhece a ti mesmo socrático. Olhe para dentro de ti, vou completar a observação socrática. O homem para se tornar um antropus, o antropus não quer dizer homem, antropus quer dizer aquele capaz de iluminar, capaz de olhar para os deuses, isso é o significado original, tem que fazer duas viagens, uma para dentro e uma para fora. Eu falei viagem para fora, não é como CVC Viagens, tá? É para fazer viagens conhecendo o mundo, as pessoas de verdade e a viagem para dentro é conhecendo os mistérios dentro de ti. Isso pode ser feito pela tua contemplação, pela sua meditação, pelas suas leituras e pela ajuda do outro, sem dúvida alguma. Reflexão, não tem coisa mais rica do que reflexão, voltar-se para dentro, buscar o sentido. O que eu estou fazendo aqui, né? Sócrates, inclusive, gostava de dizer aos jovens que se preparavam para os Simpósios que deveriam passar a tarde debaixo de um plátano, que são essas árvores sombreiras, onde ao lado de um riacho para escutar o doce passar das águas. Embaixo dessa árvore prestar atenção no farfalhar das folhas, porque lá eu teria a voz dos deuses. E “ocupem as mãos” ele dizia, com a sua túnica, “enrolem para cima e para baixo”, porque mão de jovem desocupada é desastroso. E mais, ele dizia, no máximo a dois, primeiro porque sem diálogo não há consciência e com o terceiro nasce a balbúrdia. Reflitam, escutem, pensem, ouçam os deuses falando e não me venham de noite do simpósio com a cabeça vazia.
Palavras finais do professor aos estudantes de mitologia e psicologia.
Comece buscando um sentido na tua existência. Esse sentido tem um segredo que só você pode desvendar, esse é o motor da tua vida, todo o resto é resto. Não viemos aqui para ficar ricos e nem pobres também, não se trata disso. Nós viemos aqui para realizar algo supremo que é nossa missão, trate de descobrir isso. Esse é o motor da sua vida.
Professor Dr. Viktor Sales dedica-se ao estudo das tradições e mitos das antigas civilizações gregas, egípcias, judaico-cristãs, caldéias e orientais. Dr. Viktor Salis é professor dos cursos de Pós-graduação no ICHTHYS Instituto. Para conhecer nossos cursos acesse nosso site.